domingo, 29 de maio de 2016

A Janela e o Pátio




Não desisto de habitar a janela que dá para o pátio, recanto de pardais logo ao amanhecer e de grilos anunciando a noitinha. As acácias rubras pintam de vermelho a calçada, deixando o verde despercebido. É Maio. Maio dentro. Mês do vermelhaço denso das pétalas que faz do pátio um templo e a janela santuário de sons, de cores, do desgaste do sol com o passar das horas. 
Pátio, paraíso de jovens amigos do charro, de pombos e de cadelas parideiras, paradeiro do Txany, o demente que todas as manhãs lê o universo de cabeça para baixo, invocando sítios onde as coisas se sucedem na velocidade da luz da sua imaginação, coisas sem pretensão de existirem, porque coisas sem coisa, porque genuínas tal como o tronco da manhã. 
Acompanho a sua ascendência á montanha incolor dos seus apelos, onde o sim e o não perfazem os trezentos e sessenta graus da existência da sua vontade nómada.
Debruçado à janela de tanto apreciar, de repente o pátio transforma-se em nebulosas em espirais a sugar o meu corpo como um objecto levado pelo tornado, a deambular entre as paredes do pátio, entre o ver e o sonhar, entre a loucura dos canteiros vazios e a surdez das pedras da calçada. 
Dou com a minha cabeça no frágil amparo de minhas mãos como se ela quisesse desprender e colocar-se no esqueleto da demência que não parava de recitar versos e cânticos desafinados, ardentes de loucura, avermelhados pelos vinhos das acácias rubras em flor, autenticas viagens pelas manhãs de Maio. 
Como é louca a janela do pátio. Ela é como estábulo de dias bons e de dias amargos que a vida impõe. Ambos, companheiros de presídio do poeta.

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RAPIZIUS

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