Em finais de Outubro parti de Mindelo e o 24 de Setembro de
1974 deu-se comigo em Bissau. Os guineenses tinham acabado de tomar em suas
mãos a terra, sentindo-a muito sua. Via-se isso em todo o lado da cidade de
Bissau. Na periferia era a pobreza escancarada. A população pouco ou nada
escolarizada vivia na lufa-lufa da rabidância, próprios de uma sociedade com
fossos sociais bastante pronunciados.
Apesar de essa realidade chocar muito o visitante atento,
bons momentos ali passei, convivendo com guineenses e caboverdianos que ali
trabalhavam e viviam com as suas famílias.
Tinha sido o Dr. Boal a me assistir e a medicar no Hospital
Simão Mendes, recomendado pelo então Secretário-geral do PAIGC - Aristides
Pereira, que me tinha concedido audiência uns dias antes no secretariado-geral
do partido na praça dos Heróis Nacionais.
Foi uma experiencia agradável e emocionante, sobretudo
porque tive a oportunidade de ver muitos dos que se entregaram à causa da luta
de libertação das nossas terras.
Informei-me bastante nos trinta e poucos dias que ali
passei. Regressando, algo latente veio dentro de mim, em resultado do contacto
directo com a cultura desse país irmão, dança e ritmo, manifestações coroadas
com o espectáculo de honra, o Balé Africano, de Okinka Panpa e a dois grandes
concertos musicais de uma das mais prestigiadas bandas africanas de então, o
Bembeya Jazz Nacional da Guiné Conacri, tudo isso graças à minha condição de
membro do PAIGC – Cabo Verde. Foi decisiva a aprendizagem para o estilo de
música que desde então passei a compor - o funanbah - que ainda hoje ando a
aperfeiçoar.
Alegra-me o dia de hoje e ao mesmo tempo me entristece saber,
ver e ouvir o que por lá se passa e acontece nesta terra africana que encheu de
glória a luta de libertação dos povos oprimidos.
Entristece, lembrar as fortes mensagens do poeta e músico
Carlos Shwartz prenhe de sonhos e ditames que incomodava a elite instalada, caído
por terra, mas que um dia há de, certamente, renascer com a força do tan-tan
(adormecido).
Kaka Barboza
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