Por mais simples que seja um livro e por mais acessório seja
o seu autor, ele representa uma verdade particular, aquela que ao próprio diz
respeito, a que lhe coube verificar e plasmar, sem nada desafiar e nem
pretender alcançar altares, senão cumprir com rigor e com boa-fé os ditames da
sua sensibilidade artística.
Aprender a falar escrevendo é um acto lisonjeiro e faço-o
porque a escrita não é um tratado que se celebra com ninguém, antes um processo
prático de exercitar o sonho, ou de conferir as realidades repentinas que
ocorrem durante o acto reflexivo, aferição que geralmente convida à tomada de
notas, sendo, a resultante o convite à uma vida plena de satisfações, talvez, a
que amaríamos viver.
O acto da escrita não é acto isolado. Nunca estou só quando
escrevo. Pressinto desdobramentos e revezamentos, quiçá, incorporações.
Ilusório ou não tal facto, meus textos é dele a sua sombra, já que a criação
está ao serviço do poeta assim como a obra para o seu autor. A imagética que as
palavras ajudam a construir e a perpetuar no papel é a prova disso.
A natureza do que escrevo reside na necessidade do regresso
ao passado a convite das inquietudes que buscam na fonte o som dos
acontecimentos, o som da mundivivência residente na memória colectiva. Há no
que escrevo uma forma de expressar que concilia narrações com disfunções de
ordem técnica a que os temas sugerem e se sujeitam, sendo a estruturação
poética opção intencional ou seja um repto à estética no uso absurdo de imagens
de uma realidade existente ou reinventada, absorvendo o sentido das máximas,
dos provérbios, dos mitos, das lendas, dos hábitos e costumes de uma vivência
secular.
A modernidade hoje propalada e sentida em tudo quanto é
criação dos homens, aliada á ideia de que a globalização gradua os povos e os
integra na ordem vigente comandada pelos mídias, é um facto ou um dado, ou um
processo que pode até beneficiar, mas beneficiar sem delapidar, beneficiar
desde que não imponha regras que aniquilem a razão e o essencial da identidade
das nações e dos povos. Comungar do mundo global não implica subserviência, nem
acatamento mudo de tudo quanto se apelida de actualização.
( um poema a exemplificar o texto em cima)
Erguer-se-á neste retracto a roda da espiga
inscrita na banda tricolor
que deu terra aos braços das ilhas.
Erguer-se-á nesta palma d’água a trova
e o canto das enxadas
e não haverá ferrinho nem violão
mais cantável que as enchentes e cachoeiras
guiando pão á boca e pardais aos beirais.
Erguer-se-á neste ombro da terra o rio da vida
no riso dos meninos
e não haverá destino outro nem noites
e sonhos trevosos nos lares e nas manjedouras.
E não haverá nada mais palpável
do que dois mares de água um
na boca das levadas e outro na proa do pescador.
Erguer-se-á neste charco o grito do porvir do chão
inscrito na banda tricolor de sol, suor, verde e o mar
no sempre chão dos nossos avós.
Erguer-se-á neste pedaço o poema novo
do poeta sem nome.
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