SENTIRES DE UM PASTOR DE ESTRELAS
Tenho por assento a pedra,
por almofada o silêncio,
por música o silvo
e por vereda o tempo que durar os sentires.
Tenho por paixão a viagem
conducente à gruta do amor,
uma vez alcançada,
no prado da razão sentinte ininterruptamente
se nutre.
Deste assento sondo o tempo
interior,
indagando o itinerário da estrela que
ontem à tardinha
pastoreava os gestos.
À varanda do tempo debruço-me para me
esquecer de mim
e aproximar-me do além de infindos bosques
e funduras.
Mesmo nada podendo colher do incerto,
pastor dos teus rastros,
da itinerância do teu perfume,
do teu céu sem limites,
tenazmente continuo.
Mesmo sem poder tocar tua mão,
teu gesto e tua femínea silhueta.
Amo-te com o forte gosto tirado do
tanto amar.
Mesmo longe o perto que sonho,
sinto o teu quente olfacto,
o acomodar na cama,
os passos e o café da manhã,
o acender do cigarro,
a roda no asfalto,
o digitar da mensagem,
o desfilar do sol e o suspiro à tarde.
Mesmo nada sentindo,
sinto o apertar e o roer,
o apartar e o doer
do gosto irado de tanto amar.
Mesmo nada desejar,
sinto o silvo do beijo cativo no
olhar.
Mesmo nada amar,
sinto-me amar o gostirado de tanto amar.
O Domingo traz sempre o sopro
rolando maduras folhas a um onde
qualquer
e por detrás do afumar do dia
é teu os contornos como bagos lácteos.
Agrada-me o silente abraço de mil
apertos
e beijos mil de cilíndricos odores.
Agrada-me a loucura de andar o
tempo
para a frente e para trás.
Agrada-me a vaidade de amar o perto
inatingível do teu peito.
Agrada-me a melífera saudade que me
demulce o sentir.
Agrada-me iludir-me adormecendo estrelas
em teus níveos seios.
Agrada-me imaginar-te ilha onde
tarda o entardecer
e finda a estrada dos meus sentires.
Agrada-me a pétrea almofada do voto
“para sempre”.
Praia, 2013-09-20
Kaka Barboza